sábado, 28 de maio de 2011

O Homem de preto - Capitulo III

CAPITULO III – Mais um dia


            O Homem de preto abriu a porta do apartamento devagar revelando o recinto escuro, ele entrou e trancou a porta novamente. Tateou a parede a procura do interruptor e acendeu as luzes da sala. O lugar era simples, um sofá de três lugares azul ficava de frente para uma TV de vinte polegadas e de costas para a porta de entrada, ao lado do aparelho tinha uma estante com vários livros e próximo a ela uma poltrona reclinável com uma pequena mesa ao lado que tinha um aparelho de telefone. O lugar tinha um corredor perto da estante que levava ao quarto, cozinha e ao banheiro.
            Ele sentou na poltrona e esfregou o rosto com as mãos, tirou a camisa revelando varias cicatrizes no tórax peludo. Jogou as botas para o canto e mexeu os pés sentindo alivio de ter tirado o calçado. Reclinou a poltrona e apertou um botão do telefone para ouvir os recados gravados na secretaria eletrônica. Poderia comprar um celular, mas achava desnecessário, além de não gostar.
            O aparelho fez um sinal sonoro e o primeiro recado foi ouvido.
- Ei cara, um amigo meu me deu teu número. – a voz era rouca e nervosa – Você?!  Não!!! Merda.... – um grito de dor e pavor ecoou do outro lado.
- Acho que não vou ter que me preocupar em retornar pra esse ai! – O homem de preto riu.
            Os outros recados eram semelhantes, vários seres queriam os serviços dele, porém ele não estava aceitando serviços atualmente. O motivo só ele sabia, e preferia que fosse assim. Se as pessoas erradas soubessem a razão das recusas, as coisas ficariam feias.
            O sinal sonoro mais uma vez soou, era o ultimo recado e ele imaginava qual seria a proposta. Uma voz feminina começou a falar e o homem de preto arregalou os olhos e se ajeitou na poltrona.
- Oi, como você tá? – a voz era suave e carregava um tom de tristeza – Sei que não gosta que eu ligue, mas, estou preocupada você não me dá noticias. – a mulher respirou – mas, tá tudo bem! Eu confio em você. Se cuida, beijos!
            Ele parou, olhou a noite pela janela sem se levantar. Foi até a cozinha, pegou uma lasanha congelada na geladeira e colocou no microondas. Voltou para a sala e em pé mesmo discou no telefone o número que sabia de cor.
            Três toques e uma mulher atendeu do outro lado da linha.
- Oi, ouvi o teu recado. – disse o Homem de preto.
- Você tá bem? – perguntou a mesma voz suave e triste de antes.
- Eu tô legal. Mas, eu não liguei pra falar de mim. – disse ele – Só liguei pra te dizer que tô no rastro certo e que logo, logo tudo vai ficar bem.
            Do outro lado a mulher começou a chorar, e o Homem de preto passou a mão pela barba.
- Obrigado! – disse a mulher entre lágrimas, e depois ficou em silêncio por alguns segundos – Queria você aqui.
- Só liguei pra te tranqüilizar. – ele passou a mão pelos cabelos – Agora tenho que ir.
- Tá, tá certo. – a voz dela estava mais triste agora – Confio em você! Beijos, tchau!
- Tchau.
            Ele desligou o telefone e se jogou no sofá, colocou o braço sobre a testa e ficou olhando o teto.
            O tempo passou de forma que ele não percebeu. Só se lembrou da lasanha por que o microondas apitou denunciando que sua comida já estava pronta.
            Naquela noite a comida estava sem gosto, mesmo a lasanha que ele tanto gostava. Depois que comeu, pegou uma garrafa de suco pronto e foi para o quarto. Deitou na cama e com o controle remoto ligou o CD player, que começou a tocar nothing else matters do Metalica. Ele fechou os olhos e procurou relaxar um pouco, pelo menos hoje poderia fazer isto, já que amanhã qualquer coisa relacionada à paz, tranqüilidade e relaxamento seria esquecida por ele e por muitas pessoas também.
            Seus pensamentos se fixavam na bruxa e em seus guardiões, ele estava sem nenhum dinheiro para pagar por nada. Teria que fazer as coisas a moda antiga, invadir o lugar, matar os guardiões e obrigá-la a fazer o serviço. Ele riu, preferia agir assim mesmo, podia descarregar o stress em cima de alguém pelo menos.
            Bebeu o restante do suco e jogou a garrafa vazia para o lado, esfregou os olhos, estava com sono e as vodcas que bebeu estavam ajudando aumentar a sensação de cansaço. Olhou o relógio na mesinha que ficava perto da cama. Já passava da meia noite e amanhã o Homem de preto teria que fazer valer jus a sua fama.

***

            A floresta era evitada por todos os fazendeiros que moravam perto dela, tinha fama de ser amaldiçoada. Desaparecimento de pessoas era comum, e a policia nunca obteve êxito nas buscas realizadas nela. O que contribuía para aumentar a fama de floresta habitada por demônios e toda sorte de seres das trevas.
            A única habitante da floresta se chama Cailena, uma bruxa muito antiga que depois de andar pelo mundo decidiu fixar moradia ali e não gostava de visitas, exceto de seus clientes. E ela tinha como saber quem vinha até ali em busca de seus serviços, e os que não tivessem esse objetivo teriam um fim trágico.
            A casa dela era bem simples, construída em pedra, próximo a uma cachoeira. O lugar tinha sido erguido pelos “visitantes” que ela escravizara.
            Cailena tinha longos cabelos negros e cacheados, corpo magro e bem delineado, seios pequenos e arrebitados que se destacavam sob o vestido branco que usava, seus olhos eram de um azul profundo. Estava debruçada sobre seu caldeirão que ficava na sala de rituais em cima de um pentagrama desenhado por ela e com varias runas em volta. Nas águas do caldeirão a imagem do Homem de preto era visível, ele deitado em sua cama terminando de beber suco de uma garrafa plástica.
- É este que eu quero que vocês eliminem. – sua voz era sedutora e macia.
            Enquanto ela falava dois seres saiam das sombras, eram uma mistura mal feita entre homem e corvo. Tinham um bico curto e negro, olhos grandes e escuros numa cabeça semi-humana. Suas asas estavam no lugar dos braços e as mãos ficavam no final destas e tinham garras afiadas. No lugar dos pés, patas de corvos. E penas negras cobriam seus torsos.
- Vão e não me decepcionem, meus filhos. – ela sorria- Mostrem a este idiota com quem ele está lidando.
            As criaturas voltaram para sombras, deixando Cailena sozinha observando seu caldeirão onde era possível ver o homem de preto.