sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Aço


O frio aço
Passa deixando um rio de vida
Que se esvai
Deixando dor e prazer passageiros
Reflete o brilho de prata
Que a doce lua lança
Na esperança de iluminar
O frio e insensível aço
Que agora carrega gotas de vidas

Essa é minha vida


Essa é minha vida
Beber com meus compadres
Até cair e perder a noção de tudo
Falar alto frases sem sentido
Gritar “viva!” a algo que não sei o que é

Essa é minha vida
Criar mundos imaginários
Onde tudo posso e tudo faço
Brincar de Deus com vidas
Que crio em minha mente insana

Essa é minha
Amar sem ser amado ao menos um segundo
Se enganar sempre
Fazer tudo errado
Essa é minha vida...

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Um simples relato

Um simples relato


            Bem, por onde posso começar? Acho que vou ser clichê e contar a vocês em ordem cronológica os fatos que se sucederam comigo.
            Meu nome? Isso não é importante, os acontecimentos é que são importantes. Basta a vocês saberem que sou um homem na casa dos trinta anos, bem de vida e com vários amigos. Ah, e claro que apesar de não ser nenhum Tom Cruise, tenho meu charme. Vamos aos fatos.
            Se bem me lembro, eu estava em meu apartamento cozinhando macarrão para comer com molho de tomate e carne moída naquela noite. Tinha comprado um vinho tinto e moído a carne na hora. Coloquei o macarrão na panela para cozinhar quando meu celular tocou, era uma amiga um tanto quanto intima, se é que vocês me entendem.
- Oi meu amor! – falei assim que atendi.
- Oi! Preciso de sua ajuda! – a voz dela passava uma certa aflição. – Posso ir ai agora?
            Eu estranhei a pergunta, pois ela simplesmente chegava sem avisar sempre que queria curtir uma boa noite a dois comigo.
- Claro que pode, minha flor. – eu parei por alguns segundos – Mas, o que foi que aconteceu?
- Quando chegar ai eu te conto. Querido, acho que estou muito encrencada.
- Calma! Venha logo pra cá.
            Ela se despediu e desligou o telefone. E eu fiquei com uma curiosidade enorme. O que minha amante casual tinha feito, será que tinha matado alguém? Se envolvido com algum homem casado e a esposa traída estava em busca de vingança? As piores hipóteses passavam por minha mente, mas, nenhuma delas chegaria perto do que realmente estava acontecendo.
            Quando a comida já estava pronta e o vinho já aberto. A campainha tocou, abri a porta e tomei um susto ao vê-la com cabelos desgrenhados, maquiagem borrada e olhos vermelhos.
            Assim que me viu, jogou-se em meus braços aos prantos e soluçando.
- Eu tô morta, eu tô morta...
            A coloquei para dentro e fechei a porta do apartamento a fim de evitar vizinhos curiosos. Sentei-a no sofá e fui buscar uma taça de vinho para ela que tomou tudo de um só gole.
- Agora se acalme e me conte o que está acontecendo. – falei com uma calma anormal.
- É culpa disso aqui, tudo é culpa disso aqui! – ela gritou jogando um medalhão antigo no chão.
            Abaixe-me e peguei a peça que era de prata antiga e tinha a imagem em alto relevo de dois dragões se enroscando, formando um círculo enquanto um devorava a cauda do outro.
- Isto aqui é a causa de seus problemas?! – olhei indignado para ela – Você roubou isso de quem?!
            Ela me olhou sem entender direito a pergunta que tinha sido feita. Me ajoelhei diante dela e refiz a pergunta bem calmo.
- Eu não roubei de ninguém! – ela respondeu entre lágrimas – Minha tinha morreu, e em seu testamento ela me deixou isso. Ela devia me odiar muito!
- Por quê? É uma jóia linda!
- Você tem que acreditar em mim, no que vou te contar!
- Claro meu amor. – disse complacente - Agora conte tudo.
            Ela respirou fundo e enxugou as lágrimas que escorriam pelo rosto.
- Quando recebi isso. – ela apontou para o medalhão em minhas mãos – Achei lindo, mas, em menos de três dias minha virou um inferno. Passei a ouvir passos e risos dentro de casa e na rua via vultos de coisas horríveis.
            Ela parou e me pediu mais vinho. Eu trouxe a garrafa inteira para ela, que tomou logo um gole farto.
- Eu pensava que era só impressão minha, mas, hoje apareceram essas inscrições. – ela pegou o medalhão e mostrou-me a parte de trás. Lá estava inscrito de forma clara e legível.
“ Os pecados do sangue serão pagos com sangue.”
- Que pecados são esses? – perguntei curioso e com um certo receio.
- Não sei! – ela tinha voltado a chorar .
            Eu a abracei com carinho e beijei seus lábios para acalmá-la. Ela retribuiu o beijo e me afastou com delicadeza.
- Depois que a inscrição apareceu, eu tive certeza que não era impressão minha. Os vultos que eu via na rua estavam atrás de mim.  – ela tomou outro gole – Quando me olhei no espelho hoje, vi que por trás de mim havia um velho com olhos e boca costurados tentando me abraçar.
            Enquanto ela falava lágrimas escorriam pelo seu rosto e de repente ela gritou assustada apontando para trás de mim. Virei-me rapidamente e mesmo que alguns instantes, pude ver uma criança nua, sem sexo definido com olhos e boca costurados. Minha amiga agarrou-se ao meu pescoço soluçando.
- Não deixa eles me machucarem, não deixa!
            Eu não sabia o que dizer. Segurei-a pelo braço e corremos para a porta. Ao tentar girar a maçaneta percebi que estava trancada e não importava a força que colocasse, não abria.
            Os risos começaram, primeiro infantis, inocentes, depois de velhas risonhas e maldosas. Minha amante sentou no chão encostada na porta e gritava por socorro. Pelos cantos da sala e pelo corredor eu via vultos disformes correndo de um lado para o outro.
            Os risos aumentaram e com os eles vieram também vozes de mulheres que diziam repetidamente os dizeres do medalhão:
“ Os pecados do sangue serão pagos com sangue.”
“ Os pecados do sangue serão pagos com sangue.”
“ Os pecados do sangue serão pagos com sangue.”
“ Os pecados do sangue serão pagos com sangue.”
- Que pecados são esses?! – gritei com raiva – Quem pecou?!
            Várias crianças assexuadas e com a face costurada apareceram diante de mim, elas riam e minha amiga gritava. Eu sentia vontade de chorar, mas, não conseguia. Eu sentia vontade de correr, mas, não conseguia.
            Olhei a minha volta e vi que as paredes de meu apartamento estavam cobertas por uma membrana pulsante e ensangüentada, eu vomitei, minha amiga gritou alucinadamente. A levantei do chão puxando-a com força e corremos pelos corredores em direção ao quarto. Meu coração quase parou quando olhei pela janela e em vez de ver os prédios da cidade vi corpos mutilados e retorcidos tentando entrar.
            Senti braços magros e fortes abraçando-me, me deixando imobilizado. Nós dois gritávamos, enquanto eu assistia me debatendo em vão, às crianças nefastas se aproximarem de minha amiga que estava deitada em posição fetal no chão chorando e soluçando compulsivamente. Os braços me apertavam com força, expulsando o ar de meus pulmões. As crianças estavam sobre ela, rindo. O mundo a minha volta ficou escuro.
            Quando acordei, raios de sol entravam pela janela do quarto e fustigavam meus olhos. As paredes estavam normais, o mundo lá fora também, minhas costelas intactas. Procurei por minha amiga por todo o apartamento e nada. Liguei para nossos amigos em comum, ninguém a tinha visto.
            Já estava achando que tinha sido um sonho, quando vi no chão da sala o medalhão com os dragões em alto relevo. Mas, agora não estavam devorando a cauda um do outro, e sim face a face. Com ele em mãos tive certeza que não tinha sido um sonho.
            E sejam lá quais eram os pecados cobrados.
            Eles foram pagos.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Rápida observação


O que queremos
Está distante
Porém perto demais

O que buscamos
Já foi encontrado
Mas não descoberto

O que precisamos
Nos mata
Mas é nossa vida...

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O tempo que passeia


Com os pés
Apoiados na grade de minha cela ilusória
Eu vejo o tempo passear de mãos dadas
Com o destino
Que eu descartei e chorei

Com a boca ferida
Tento partir minhas algemas de fantasia
Que não me deixam abraçar
Este mundo
Que alegra meu coração
Que parou...

domingo, 11 de dezembro de 2011

O Homem de preto - Capítulo VI


CAPITULO VI – C10

- Então é isso? – perguntou Tobias.
- É? – O Homem de preto bebeu de um só gole o copo de vodca.
- Quanto tempo você tem?
- Agora? – ele franziu a testa. – Acho que umas duas semanas.
- Por isso a pressa em chegar até a bruxa, certo? – Tobias comeu um pouco de purê de batatas.
- Ela é a melhor que existe em localizar pessoas. – ele mastigou um pedaço de frango.
            Os dois se olharam em silêncio. O Homem de preto colocou mais vodca em seu copo e riu.
- Aposto que foi a vadia que mandou aqueles dois filhotes de chupa-cabra.
- Deve ter sido. – Tobias deu de ombros. – Você tem tantos amigos não é? – o velho índio fez aspas com as mãos ao dizer amigo.
- Conseqüências meu velho, conseqüências.
            Tobias levantou-se e foi saindo da cozinha. O Homem de preto olhou intrigado.
- Ei! Pra onde você vai?!
- Espere aqui, não demoro.
- Pronto! Que diabos esse velho doido tá tramando? – pensou o homem de preto.
            Poucos instantes depois o outro voltou com uma espingarda de caça nas mãos e uma cinta com munição. Parou diante do jovem amigo rindo.
- Vamos!
- Pra que isso?!
- Eu sou um curandeiro garoto, esqueceu? – Tobias deu um cascudo nele e ficou sério – Não conheço nenhuma magia de ataque e não sei lutar muito bem. Por isso vou levar minha amiga aqui. – a tosse veio com força.
- Acho que tô começando a mudar de idéia sobre você vir comigo. – ele levantou-se e pousou a mão sobre o ombro do amigo. – É melhor você ficar e cuidar de sua saúde.
- Nem pense nisso! – disse desvencilhando-se do amigo.
- Tobias sua saúde tá frágil e essa arma não vai ser muito útil, fique.
            O índio riu alto e tossiu.
- Tolo! Você só sabe destruir e matar. – ele ergueu a arma – Sarissa colocou um encantamento de fogo aqui, ela pode causar um bom estrago!
            O Homem de preto riu e colocou as mãos nos bolsos.
- Bem, estão vamos, ainda tenho que comprar roupas novas pra mim.
            Os dois saíram e pararam diante de uma Chevrolet c10 azul. Tobias abriu a porta do lado do motorista.
- Nós vamos nisso?!
- Olha como fala moleque! Esta aqui é um clássico e é melhor que muito carro moderno. Agora entra ou vai andando.
            O Homem de preto entrou na c10 e Tobias deu a partida. O carro saiu devagar pelas ruas da cidade ganhando velocidade aos poucos a medida que se aproximava da estrada norte que era o caminho até a floresta na qual a bruxa vivia.

***

            Cailena estava às margens de um lago em sua floresta observando através das águas escuras e paradas o homem de preto e o velho índio que havia juntado-se a ele. Ela estava temerosa, não com Tobias, mas, sim com o outro. Os rumores sobre a brutalidade e o poder dele estavam mostrando-se reais.
            Ela ergueu as mãos, olhou para o céu e gritou com uma voz gutural. Nuvens começaram a se aglomerar logo acima do lago. Cailena fitou o centro do lago.
- Senhor da desolação, mestre da dor, arauto da carnificina! Filho da grande Lilith! Eu o convoco o poderoso Asriandir! – Cailena descreveu um arco com umas das mãos e uma criança em transe surgiu ao seu lado e uma adaga na outra mão. – A ti ofereço este sacrifício de carne e sangue, ó poderoso Asriandir, vinde a mim!
            Ela colocou a criança a sua frente olhando para o lago e rapidamente degolou o infante, segurando a cabeça dele para que o sangue espirasse nas águas escuras.
            O sangue escorria fartamente caindo no lago. Quando a criança estava quase no fim de sua vida Cailena jogou-a nas águas diante de si gritando.
- Asriandir! Asriandir! Eu invoco a ti!
            As águas do lago se moveram em redemoinho e aos poucos uma criatura foi erguendo-se de seu centro. Seu torso era escuro como ébano e robusto, seus braços terminavam em garras poderosas, a boca era repleta de dentes de tubarão, os olhos poços de lava, chifres de carneiro brotavam-lhe da testa e da cintura para baixo era um corpo de pantera com cauda de escorpião. Ele facilmente alcançava o tamanho de um elefante e trazia nas garras o corpo da criança ainda agonizante.
- Seu sacrifício foi aceito com prazer mulher. – disse Asriandir com uma voz rouca e tenebrosa devorando o corpo infantil.
            Cailena riu alto. Trovões soaram ao longe anunciando uma tempestade.

***

O Homem de preto olhou pela janela da C10 o horizonte e viu que uma tempestade aproximava-se e riu. Tobias olhou para ele intrigado.
- O que foi? – perguntou o velho.
- Vai chover.
- E daí?
- Gosto muito de chuva!
- Agora entendi. -  Tobias riu – Tá ai uma coisa que não se vê todo tempo!
- O que? – Perguntou o Homem de preto.
- Você dizendo que gosta de alguma coisa.
            Os dois amigos riram. E o Homem de preto lembrou-se de um tempo em que risadas como aquelas eram constantes e o riso morreu em sua garganta.
            Porque ele sabia que esses tempos não voltam mais.
- Acelera. Essa estrada é uma merda quando chove.
            Tobias acelerou levantando poeira, aproximando-se cada vez mais da floresta da bruxa.